domingo, 6 de dezembro de 2015

AO ROGÉRIO


Quase posso ver a cena:
um menino,
de repente,
salta ao mundo,
e meus olhos se esquecem
da vida mundana . . .
se enroscam
a sua  . . . Sem medo,
sem dor,
sem fim . . .

sexta-feira, 13 de novembro de 2015

VIDA POSSÍVEL

De dentro de um riso
ensaiado,
passo a vida ao avesso,
e escuto as promessas
da noite,
os  rangidos sombrios
da turba esgotada . . .
os passos,
vozes da angústia festiva,
a bailar sôfrega,
impaciente,
descabida.

E vivo o que me é dado,
oblação fugaz do sol,
quem diria,
presente ao revés,
óbolo atirado,
aceno  penalizado
pelo que é reles 
e ínfimo  . . .
Sonho com a lua
vestida de gala
atrevida . . . apaixonada . . .
Penso um céu de festas
inventado, mas vivo.
Jogo-me despido
no mar de imagens e promessas,

e permito-me o baile
solene
da história falsa,
ópio redentor
que a tudo adula
e conforta.
Inebrio-me do blefe
da relva fina,
ama  de leite da vida,
e vivo . . . vivo . . .
Até  não  mais poder . . .

segunda-feira, 26 de outubro de 2015

MAIS QUE A VIDA


Quero mais que a vida
sem cor,  sem disfarce,
aurora escondida
ou sonho que nasce

desponta aguerrido,
explode, se esgota,
se esvai . . . é esquecido . . .
Lembrança remota  . . .

Não!  Eu quero mais!
Vida plena, a estrela
esbelta que faz
a noite ser bela

e o verso cantado
ser limpo, eloquente.
Quero o riso dado
de graça,  insolente..

Quero, sem temor,
inventar meu mundo,
minha história: amor
e um querer profundo

que possa buscar
sem dor ou temores.
Não! Quem dera amar
e cobrir de flores

aquela que a tarde
puder trazer, linda!
Quero, com alarde,
vida, valsa infinda.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

CAFÉ DA MANHÃ

Janela aberta!
Vídeo limpo,
recorte do mundo,
aparição repentina
de vida esgarçada,
passageira . . .

Parto diário
de encontros
e embates,
ilusões camufladas
e angústias sorrateiras
abafadas . . .

Segredos desvelados
gratuitos,
escrachados  . . .
Culto ao comum
que é único
e ao insólito
que é lógico.

Janela aberta!
Do lado de um café,
a doce certeza
da vida a andar
sem trégua,
do amor a flotar,
incógnito,
pelo dia.
O certo do mundo,
o simples,
único  . . .
O chamado inevitável  . . .

domingo, 27 de setembro de 2015

DISTANTE


Queria poder abraçar-te
Agora
Mas estás distante
Onde não te alcanço
Meus braços, meus olhos
Minha dor
Não se cabem

Queria poder beijar-te
Tanto
Mas minha boca
Só sabe dizer versos
Tristes
Soluça ao dizer teu nome
E ensaia
Nossa canção
Sozinha

Queria poder amar-te
Muito
A ponto de quase desfalecer
Tocar em algum céu
Contigo
Viajar a qualquer ponto
Colado a ti
A qualquer mundo
A que possas querer
À eternidade
Que só tu me podes dar
De presente

Queria poder viver
De ti
Alimentar-me
De teu pensamento
Curar-me com tuas palavras
Erguer-me por tua força
Voar pelo incrível
Milagre
Que és para mim
Mas estás distante


sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Sol da manhã

Na manhã,
um sol disperso,
vida em gotas
a fluir tímida

qual doce
que, aos poucos,
se atreve
e sacia,

onda calada
a invadir a calma
e despejar
sabores . . .

O sal do mundo,
gosto da terra,
desejo e dor
de tudo que vive
ou anseia.

Sol sedoso,
pura canção,
mensagem
a ensaiar toda forma
e cor,

hino eventual,
sorrateiro,
a ensinar,
solene,
toda razão
ou sentido
de se viver . . .

Sem porquês   . . .
Sem custos . . .
Sem mais . . .

quinta-feira, 10 de setembro de 2015

HORAS ARRASTADAS

Quanta espera!
Horas arrastadas
A cada dia . . .  Cadeado . . .
Sopro morno,
Carpido . . .

Vida adormecida.
Sem lua
Ou medida,
Mendiga . . .
Fôlego atado,
Seresta  triste . . .
Poema que não fecha,
Rabisco . . .

Quanta falta fazes,
Quanto sol me negas,
Desabrigo . . .

Quero-te! Um aceno,
Uma estrela, valsa . . .
Vivo a melodia, balbucio,
A anunciar - te,
Pequeno bilhete
Ou esboço de canção ,
Nesga . . .

Vivo da visão
E do rastro perfumado,
Prelúdios da tarde fresca,
Leve, luzidia,
Que há de vir . . .

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

PRECE EM TRÊS ATOS


Vida que me bate
e me desperta,
sopro que me leva
e refresca,
atalho a atirar-me
ao mundo . . .
ilusão nunca perdida,
aço da guerra
de cada sol que passa . . .
Alça-me!

Amor que me toma
e me assalta na noite,
trespassa - me,
assanha-me, voraz,
atrevido,
engana-me os sentidos,
e guia-me a sorte,
folha casual a bailar na brisa
e me tocar de leve
a face . . .
a estrada  . . .
Move-me!

Morte que me assombra
e seduz,
altiva voz
a despertar-me  a mente,
alumbrar-me as portas . . .
veredas . . .
florestas e calmarias,
becos da cidade,
orbes disfarçados
de pedras . . . cinzas . . .
Ensina-me!

RUAZINHA

Numa ruazinha
quieta, parada,
dei meus primeiros passos,
e passes.

Não  havia gritos,
só chamados, festejos  . . .
Solidão?  Nem pensar!
Só gols, pega - pega
e risadas.

As mais ousadas batalhas,
histórias impossíveis
e um desejo enorme
da vida distante,
intensa e feliz,
do mundo que viria . . .
Um dia . . .

VIDA LEVE

És a vida a voar leve
O tom doce da tarde
Mera gota refrescante
Até ser seiva
E sangue
Broto de alento
E relva acolhedora

Não me encontro
Sem que te espere
E te queira
Te encontre
E me entregue
Me desmanche
E me sacie
De tudo que me fazes
Me regalas
E me anuncias
Da vida que te tornas
Sempre . . .

QUANTO TE AMO !

Quanto te amo!
Tu andas em meus sonhos.
Desfilas em meus dias
e despertas  minhas noites.
Seduzes meus pensamentos
e acarinhas meu cansaço.
Sobes comigo ao topo
da mais alta montanha
e me fazes ver os campos mais verdes
da vida.
Concedes  teu riso de graça,
me fazes graça
e afugentas meus delírios.
Quanto te amo!
Quanto mundo
me apresentas!
Quanta vida me regalas.
Ah! Quanto te amo!

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Savassi

Há um passeio obrigatório
Do sol, regozijo divino,
Ou mera autocontemplação.
Praça iluminada,
Encontros . . .
Vozes a ensaiar
Cânticos
Ou leves golpes na mesmice
E na dor que não se vai
Nunca!
Hinos à vida
Pacata, descolada, 
A vida!
Filosofias e encenações
Trágicas ou cômicas
Ditadas ao pé das árvores,
Patroas soberanas da cena,
Ou ao lado de cafés
E pão de queijo,
Vizinhos comuns,
Caras antigas
E anônimas . . . Do sábado  . . .
Da espera . . .
O astro rei descansa
E se encorpa,
Repõe as forças
E testa brilhos novos,
Cores possíveis
Inéditas.
Volta-se à vida
Pouco cósmica,
Entrópica . . .
Retoma o porte
E a majestade.
Caminha vida adentro,
Céu afora . . .
Até o próximo remanso . . .
O próximo sábado  . . .

segunda-feira, 17 de agosto de 2015

VIDA


Vida que bate à porta
Doura o campo
Desenha trilhas
Enseja . . .

Doma os monstros
Estirpa a praga
Dos dias de seca
E as valas abertas
Da via íngreme
E pesada

Aplaca o querer
Insano
Desesperado
Arqueiro audaz
Estabanado
Que  a tudo estranha
E tudo esgota
E embota  . . .

Vida, oferta - te
Amiga, heroína
Arroja-te em canção
Liberta, estridente
Amante delicada
Chama o mundo
Clama por mais e mais
Mundo
Ama e ama
E, ainda mais que tudo,
Ama demais!

Vida volátil
Veloz
Voa bem alto
E zomba dos rombos
Da sorte,
Da morte
Do escuro da noite
Do céu partido

Vida!
Tudo podes
Tudo és
Mais que as horas,
Os ventos contrários,
As pedras
Tu és o todo,
O tudo
O estalar encantado
Da manhã clara
Do sol novo
Do amor
Que acena,  promete
E pousa

Vida, desaba
E grita
Refresca a tarde
E dá seu aroma
De graça  . . .

domingo, 16 de agosto de 2015

Noite amiga

Noite irmã
Sóbria dor
Remanso de saudades
E tropeços . . .
Ballet ensaiado
Albergue de poemas tristes
E serestas perdidas

Abrigo de versos
Tantos versos
Canções e lembranças
Palco de saudades
De novelas, óperas
Melosas
Banais . . .

Noite, amiga
Apelo esmaecente
Patético
Dá-me a voz perdida
A verve,  o fôlego  . . .
Faz-me poeta da vida
Artista da cor, do belo
Faz desta dor, música
Aceno eloquente
À doce amada
Distante . . .

Escreve comigo a sonata
Escultora
Ama solícita
Regaço e brisa
Milagre repentino
Flor azul a decorar
E cobrir
O rumo e o quintal . . .
Da doce amada
Nada mais . . .

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Poema do dia dos pais


Foi um tempo curto
Quase um sonho . . . breve
Um fôlego relâmpago
Pedaço miúdo
Célula tímida
De tudo o que viria depois
Mas, seu rastro é imenso
Forte, ousado
Desperta e perfuma
Alenta e desafia
Tempera a história que, um dia, inventou
E lembra que a vida vive
É boa, bonita
Perigosa . . .
Afinal, é vida
Vida, nada mais

E eu vivo, vivo . . .  

sexta-feira, 24 de julho de 2015

RASTRO PERFUMADO


Longo é o dia
quando me estás distante.
Voo de ave perdida,
abismo infinito
a corroer o tempo . . .
lentamente  . . .
Afago a se implorar
e brisa que não toca . . .
Dor que não se cabe . . .
Abandono . . .

Larga é a espera
por teu toque
e tua canção soprada
a cada fala,
teu riso e beijo,
dádivas fugazes
porque, na dor do desejo,
criam figuras e sonhos
de azul
e eterno . . .

Leve é  o céu
a se mostrar
e galante, o sol a me abraçar,
quando me apareces . . .
e me acenas . . .
Vivo é o mundo
quando és mais que ideia
ou rastro perfumado.
Então,  a vida desce
qual gota refrescante
de uma chuva doce
que me traz o ar
e meu próprio ser

que imaginava perdidos . . .

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Caminhos



A noite é morna,
calada,
vazia de gestos,
moça esquecida,
órfã.

Não me encontro em seu silêncio
nem me dou a seu aceno
soturno,
a sua canção
que se quer sedutora
de ninfa traiçoeira,
quase sóbria,
quase esbelta,
mas triste.

Não  me engano,
nem me iludo . . .
nem busco fôlego  em seu sopro . . .
Não!  Não caio
nem me atiro,  nem nada!
Vivo à parte desse sonho
apático
de barco que navega
para o nada,
sem norte, abismo
ou céu.

Vivo a vida que me cabe
sem reservas
nem visões. Apenas volto - me
ao passo rápido
da velha busca
do amor distante,
da festa escaldante,
do raio alegre que acorda
e faz barulho.

Não me agarro
aos braços flácidos
da noite arcada . . .
Não me carrega
a triste dama.
Nunca!
Vivo para o sol que sinto
surgir no fim da cena.
Corro  no rumo
que me afaga a passada
e me sopra, eu bem sei,
ainda que esgotado
e roto,
para os únicos braços
que quero
e espero.



segunda-feira, 18 de maio de 2015

Saudade


Amor . . . Tua distância
rouba a brisa e a flor da tarde . . .
E de mim . . . auroras  . . .

domingo, 10 de maio de 2015

Desejo de ser


Do alto do sonho,
olhar de águia,
faro assanhado  . . .
desgosto da vida,
e mais vida,
aceno sóbrio,
lança oculta a esperar,
ávida,
o que se embala
em certezas
e espreita  . . .

Luta inglória
contra o sol inexorável
e a lágrima iminente  . . .
Parto com data incerta,
assim como é a vida
sem mistérios,
como a dor que se sabe
mas não se aceita.

Flerte com a terra,
de um céu postiço,
criado dos andaimes da razão
até que a flor se esmaga
e esmigalha
qualquer beleza.

Do lado da angústia,
sombra, sol
e escombros . . .
Aceno à tristeza
que não se cabe
e empece.

Do alto do sonho,
um respiro,
até plausível,
rastro de perfume
ou droga que afague
e console,
Qualquer coisa:
até a dor da dúvida
ou o orgasmo
vívido
e confuso
da espera.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

segunda-feira, 4 de maio de 2015

Cuidado

C omo
U ma
I mensa
D iadema
A pareces
R ainha
E splêndida
I magem

D ou-me
E namorado

T odo
I nfinito

terça-feira, 28 de abril de 2015

PRECE À POESIA



Poesia
Nasces da tarde
Vives na noite
Voas e acenas
Troças dos seus
Abalas certezas
Confundes
Arrebatas
Anseias
Afagas a vida
Morna . . .
Choves no campo
Brilhas na estrada
Inquietas


Amada poesia
Acolhe teus pobres
Teus tristes
Perdoa teus ingratos
Teus sóbrios
Teus filhos . . .
Acorda teus débeis
Atautos certeiros
Guardas da vida
Mata o riso
Fácil,  obreiro
Tolo
Traz o sonho
Pra vida
Leva a vida

Pra vida


segunda-feira, 20 de abril de 2015

A noite é viagem

A noite é viagem 
quando estou contigo. 
Salto deste mundo
frio, sem estrada,
porto  . . . 
Quebra de ditos,
sentenças, 
ritos,
tristezas . . .
Aconchego  . . .
Silêncio  recortado 
e invadido 
por espasmos 
e juras
de vida, 
de beleza, 
de infinitos. 
Doce encontro 
de paz
e loucura,
brisa
e vendaval. 
Descanso sereno 
que, de repente,
se esgarça 
e se tinge 
da cor ofegante 
da busca cega
do prazer mais alto
e mais novo . . .

A noite é viagem
por ti,
contigo.
Aborda meu ser,
sem reservas,
e me leva pra longe, 
para onde nem quero saber.
Viagem ao sonho mais distante,
na nave mais linda
e próxima, 
mais suave
e aprazível  do mundo.
A noite é  viagem,
salto desta vida,
promessa,
realidade azul,
ou apenas mergulho 
em um céu qualquer, 
onde quer que seja,
que, de repente , 
me inventas
e me regalas.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Quadro balouçante



Campo.
Universo a explodir,
canção sustenida
despertando querer
e novas epopeias.

Hino mudo de amor
disperso
e antigo
(quase ancestral,
meio patriarca . . .).

Cenário das tocatas
melosas
do dia fútil
de todo dia.

Quadro balouçante.
Fundo de tela frio
e sem poesia . . .

que se esgarça, porém,
e se refaz
ao toque mágico
do milagre
que te traz
como imagem repentina,
solo inesperado
a despertar a festa
indecisa . . .
criança.

Despontas do nada
e salvas a cena.
Doura o quadro
e torna os contrastes
mais vivos
e os rabiscos
em contornos exuberantes.

Tomas a frente
do quadro
e fazes da vida
uma promessa
de azul
e sol.

Tomas tudo
e tornas-te o tudo
de tudo
do todo . . .

de mim.

Ao seu lado



Quero muito estar
ao seu lado.
O tempo é, hoje,
meu sol e minha noite.
A ele me rendo
e me entrego.
A ele me atrelo,
e com ele me atraco
por um instante,
um átmo
ou o tanto que me couber

ao seu lado. 

Estrada


Uma estrada que parece dar no nada.
Aqui, um coração que voa,
acima de carros e poças,
virando ave,
vento . . .
querendo sol . . .
e uma canção qualquer,
perdida . . .
Querendo tuas mãos,
ou simplesmente teu vulto . . .
longe . . .
no fim de tudo . . .
Aonde tudo converge.

Onde tudo é.

Como posso dormir?



Como posso dormir
se trago em mim
o doce mais doce
de teu beijo?

Como deixar o sonho aleatório
roubar tua imagem
gravada em tudo que resta
de meus sentidos?

Como partir deste voo
alucinado,
se o chão pesado da vida
me prenderá, sem piedade,
a rochas sem sentido
de um querer que não se cabe?

Como esquecer teu toque
e teu abraço,
e me dar à indiferença
de sopros e golpes
da rotina, do desdém
e da frieza da vida?

Como acordar
e não me dar conta
da leveza de teu rosto
aconchegado
e colado
ao meu,
acarinhando-me o corpo
e a vida (que de repente experimento)?

Como esperar,
sozinho,
pela vida que se afasta
e se vai,
sem que tenha a certeza
completa
de que voltarei, um dia,
a prová-la novamente?

Como posso dormir,
agora,
sair deste céu de beleza,
e me dar à tristeza
e à tortura desumana
de um tempo
e um pedaço de vida

sem ti?

Simples


Sempre quis
achar, no mundo,
beleza,
dor doce,
azul,
cor . . .

Tudo é grande,
complicado,
estranho . . .
Mas,
você é simples,
doce,
feliz . . .

Para que tanta viagem?
Você está aqui!
E eu . . .

Gosto tanto de você . . .

sábado, 11 de abril de 2015

Teu poeta


Sou teu poeta,
teu pedaço de pão,
tua linha reta
(ou pontos que rodam),
tua coberta.

Teu cantor
acanhado,
sem jeito,
apaixonado.
Tua canção,
teu soneto . . .
Teu!

Toda a cor,
teu ar revolto
ou manso,
tua brisa
folgada, carinhosa,
Teu sossego . . .
Todo!

Sou teu poeta.
Aquele que te vela,
te espera.
O tipo que se esmera
e se estira,
se atira . . .
se joga . . .
Teu jogo . . .
teu laço . . .
Teu!

Sou tua razão
se quiseres,
e amante
quando queres . . .
Tua lua, se és doce,
teu pomar, se estás carente,
teu hino,
tua estrada . . .
Teu cantante esquecido
perdido . . .
Teu poeta,

sempre!

quinta-feira, 9 de abril de 2015

Fazendo amor.



Encontro-te, linda!
Flor escondida
e desenhada secretamente
pelo meu sonho diário,
voador,
abobado,
ávido.

Surges na noite,
na penumbra,
quase escuridão,
mas posso definir teus contornos . . .
Diva a entorpecer meus sentidos,
tens a graça da tarde azul
e a calma da manhã de domingo.

Quase não me contenho:
quero-te muito,
quero-te de todas as maneiras,
procuro-te em todos os pontos,
e quase não me encontro
quando te encontro . . .

Tens a forma precisa,
forma que precisa
meu ser
e meu mundo.

Sinto-me parte tua.
Parto, a cada instante
infinito,
ao encontro de uma paz
feita de pequenas descobertas
e de grandes,
e sempre novos,
reencontros.

Dou-me sem mistérios
ou tabus,
percorro-te
como se viajasse
por um paraíso
imenso
feito só de beleza
e vida
pura e verdadeira.

Dou-te de presente
meu prazer mais vivo,
atrapalhado
e puro.
Recebo de ti
teu prazer sutil,
delicado
e intenso
(ah, como consegues ser tão linda!).

Inventamos,
juntos
e perdidos,
solitários
em nosso querer mais secreto,
todas as formas possíveis
de felicidade.

E nos tocamos, enfim,
em algum lugar perdido
no eterno . . .
Fazemos amor
também depois,
quando nossos corpos,
despidos de forças
e reservas,
se abraçam no cansaço
e na doce vida
que não pensa em nada
e não quer mais nada.

Adormeço
e procuro-te
outra vez . . .
Quero-te mais,
ainda mais,
pois percebo
que a noite me trouxe
um mundo doce,
outro mundo,
que vale mais que todos.
O mundo onde te encontro
e me encontro,
no intervalo entre dois instantes
que me atrevo a batizar
de eternidade.

segunda-feira, 30 de março de 2015

Quero a vida


Não queria viver de sonhos, 
nem querer, da vida, 
mundos e fundos. 
Quisera a obra pura
e solta,  
estatueta esbelta, 
arranjo singelo
e despretensioso, 
do tempo 
e do querer humano, 
humildes artífices
do mundo tal e qual, 
da vida como só pode ser.

Não queria a ilusão louca
a percorrer-me, noites
e dias,
os caminhos e as poucas certezas,
na busca ingênua
de verdades 
e eternidades. 
Nem pensei  (jamais)
em tempo feliz,  
sem os rasgos das dores 
e as surpresas do sol
de cada dia.

Quero,  sim, a vida!
Vida, sim, de fato!
Aquela,  sem remendos
ou remédios. 
Vida pura: vida!
A que me dá o mundo, 
a terra e o movimento, 
o sol e o espaço. 
Quero mais que a idéia:
o sal, a flor e o riso.
Mais que a esperança:
o vento real,
a sombra oportuna
e as ladeiras por todos
e para todos os lados. 

Não quero versos
nem belezas encomendadas.
Nem as falsas carícias
me tocam - amores?  que amores? 
Quero encontros vivos, 
inesperados, 
sem ensaios ou normas.
Quero o doce sem aspartame
e a boca sem brilho falso.

Quero a saliva que escorre
no beijo perdido,  órfão do tempo, 
a mão cega que procura, 
o querer bruto,  sem reservas.
Quero a linha fina,
a separar o dia de luz
e a tempestade, 
quase transparente. 
Quero mais que o tudo
que se crê. 
Quero a pele a sentir,
o mundo a andar
e a vida real
a acontecer. 

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

domingo, 22 de fevereiro de 2015

SONHAR ACORDADO

Sonhar acordado
é voar da vida, 
invadir formas,  
absolutos,
explodir a tarde,
sequestrar a noite, 
quebrar a pedra de sal
e as torres do real.

Sonhar acordado
é viajar de volta
ao sabor doce de teu beijo,
sentir, em cada toque de brisa,
a  seda de teus braços, 
o mel de tuas costas
e a dor de teu suspiro. 

Sonhar acordado
é flertar com o eterno
enclausurado 
em cada instante, 
cada borda de vida
que transformas em desejo,
zombando dos gritos
desesperados,
estridentes. 
do coração que te busca
e te desenha 
no véu do tempo.

Sonhar acordado
é fingir,  de repente, 
que a vida para, 
os astros repousam
e a própria morte
se acanha e se esconde...

E todas as vias
da existência
parecem me levar,
ávido e enamorado, 
a ti,
sem enfeites 
ou aparatos,
linda
como a flor que saúda
a luz do dia
e lhe garante a cor
e a beleza. 

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

A embaladora de presentes


Olhos pregados
no pacote,  na caixa. 
A vida cabe naquele objeto
e naquele instante. 
De repente,  as dobras
no papel
repetem caminhos
e voltas da vida:
retas curtas, largos arranjos, franjas combinadas, salientes
ou casuais. 
Laços precisos, 
amarras dos tempos, 
idas e vindas no que nunca foi de fato.
Lábios apertados
medem e avaliam
a curta obra perdida na tarde,
um quadro a nascer,
entre triste ou jogado, 
vida que busca sentido 
ou qualquer razão. 
Mira sua obra, 
doce, 
qual mãe vaidosa, 
ou menestrel falastrão.
Dança leve, aba fina,
sorri de repente...
orgulhosa,  desdenhosa? 
Quem pode saber
o que vai ali ?
Fecha seu solo breve,
sem pretensão de apupos
ou prêmios. 
Desfila, leve,  na bancada, 
sem ver meus olhos
e meus pobres sonhos
a criar um outro mundo
onde o presente vira joia
e seus gestos se apossam
de nossa tarde 
e de mim. 

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

RUAS DE CERTEZAS

Se as ruas desenham nossos dias,
é porque esperamos...
ermos nas hordas,
empobrecidos,
ávidos de caminhos . . .
qualquer rumo que se almeje
sóbrio, seguro,
sereno.
Buscamos, em cada esquina,
o sumo alento,
fluido redentor das mortes
tantas,
da vida pequena,
dos descaminhos, da solidão.
São matreiras,
 sedutoras esbeltas,
vivazes chamarizes.
E permitimos  que nos moldem os corpos
e nos toldem as falas,
E nos calcam, em solo alagado,
nosso passo débil
até que a estrada se ilumine
e nos regalem os louros
do gozo e da verdade.
E nos fazem poetas da sorte,
obreiros cantantes do destino,
arautos loquazes do igual nosso de cada dia.
Mas, se as ruas desenham nossos dias
é porque esperamos
e esperamos...
Se nos moldam os corpos
é porque seguimos brutos
e flácidos,
fluidos amorfos
à espera de ninhos seguros e cômodos.
E os nossos passos?
Ai, ai, até os nossos passos. ..
Na luta desigual
 entre as forças da caminhada,
se decorremos ou derrapamos,
é porque permitimos
doparem nossos motes.
E os entregamos, depois,
de vez...
Leiloamos,
desdenhamos deles e os abandonamos.
À penúria de nos sabermos reféns,
rodamos e rolamos pela vida,
e esperamos, nada mais,
tranquilos . . .
até que a estridência das certezas

nos carregue de vez.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

ÊTRE EUX-MÊMES [1]

Enquanto janeiro despeja raivosamente suas águas sobre todos nós, o mundo parece não viver apenas de turbulências naturais. Em meio ao costumeiro clima de férias e de contemplações de paisagens e culturas diferentes, nem tudo são flashes e selfies. Em Paris, a chamada Cidade Luz, os clarões mais cintilantes vieram, desta vez, de armas de fogo. Atentado! Terrorismo! Crime! Assassinato! No último dia 7, terroristas muçulmanos invadiram a redação da revista Charlie Hedbo e fizeram doze mortos. E, no mesmo dia, num supermercado parisiense, outras quatro pessoas também foram covardemente assassinadas. Motivo? Represália contra charges satíricas ao Profeta do Islã, publicadas pelo periódico. Vingança religiosa! Ato perpetrado por um grupo de dementes ultraortodoxos e fanáticos, os quais se dizem representar nada menos que Deus. Assassinato, autoritarismo! E tudo devidamente temperado com sabores sagrados. Na mídia, o show de sempre. Reportagens a todo instante, imagens terríveis, comentários exacerbados, palavras das vítimas, acusações e a velha maneira de se tratar as (consideradas) grandes tragédias: sensacionalismo e polarização entre bem e mal. As pessoas se unindo e protestando contra o terror, com slogans e gestos de quem claramente se posiciona ao lado do justo, do correto e do humano. Muita informação, alguns fatos, muitas interpretações. E este velho professor, aqui, com a interrogação de sempre: o que vou dizer aos meus alunos?
Sim! Lá pelo início de fevereiro, voltaremos, todos nós, às salas de aula. Como sempre, ao entrar, no primeiro dia de curso, verei aquelas dezenas de alunos me mirando com cara de interrogação. "Que diabos vai nos falar?" "O que há de novo que supere o show diário das mídias e das redes sociais?" "Será que é mais um desses sujeito que vai vir com aqueles papos que não têm nada que ver com o mundo?" E eu? Vou dizer o quê? Certamente, o assunto será o atentado e seus desdobramentos. Com certeza, já estarão com um vasto repertório. O que sobrará para mim? Pior ainda, o que poderei dizer-lhes que não seja corroborar as teses lançadas em quase um mês de massacre jornalístico? Fico pensando - entre indeciso e incomodado - sobre a situação em si, os meus interlocutores e o que um ambiente pretensamente consagrado ao saber poderá lhes oferecer. Talvez, tenha de ser o mais aberto, descomprometido e sincero possível. Sim! Quem sabe o melhor de mim, nesse momento, não possa ser eu próprio? Como eu poderei me sentir nesse momento, e como posso me dar a eles - de verdade? E, como professor de Filosofia, adoro procurar coisas que não costumam ficar escancaradas em fatos e notícias.
Bem, a verdade é que sempre fui uma pessoa muito crítica em relação à religião de uma forma geral. Tendo colecionado muitos desafetos ao longo de minha juventude - em razão do conteúdo sempre questionador acerca das religiões -, acabei desenvolvendo uma forma irônica de tratar preconceitos, sectarismos, autoritarismos, segregações e dogmatismos que vejo presentes em todas elas. Porém, nem isso deu muito certo. Via de regra, me dizem que não tenho o direito de ser irônico com questões que envolvem a fé das pessoas. E, antes que a cabeça dos alunos pegue fogo, tenho de arranjar uma saída para isto, pois gente que me acusava de ser (injustamente) irônico com as religiões, agora vem dizendo defender o direito à ironia - ingrediente sempre presente em tiradas humorísticas. Agora, mudou? O que o Charlie tem que eu não tenho - em termos de direitos, é claro?
Outra coisa: que história é essa de dizer "eu sou Charlie"? Será que é justo chegar aos alunos e dizer que eles são alguma coisa? Ou que devem aderir a alguma ideia ou crença? Que instância tem o direito de decidir o que uma pessoa é? Ao me dar a eles, não poderei jamais dizer que sou, nem que eles são, pois a vida é um grande espetáculo de devir e as coisas se transformam o tempo todo. Será que eles seriam Charlie? Eu, como já disse, sou aconselhado, dia a dia, a nem tentar ser um João mais abusado que o normal . . .  E o que dizer àqueles que já vierem vestidos com camisetas Je suis Charlie?
Com certeza, virão com dizeres meio decorados, como "somos todos ocidentais". Será que sabem o que pode querer dizer "ser ocidental"? Talvez, neste momento, como professor, possa lhes dar alguma informação (e indicações de pesquisa) sobre essa construção humana de dois mil anos, que chega a um ponto - no nosso tempo - em que democracia, cristianismo, capitalismo, liberdade de expressão, consumo e individualidade são alguns de seus valores mais recorrentes. E, por falar nisso, já ouvi de gente que se diz liberal, que "esses muçulmanos têm de aceitar que somos ocidentais". Engraçado ver como, em certas situações, ser liberal não é aceitar a visão do outro, mas - sim - exigir que aceitem a nossa. Talvez, este seja um belo tema de discussão. "Valores ocidentais". O, até mesmo, "alguém sabe o que é ser ocidental?"
Por falar em ocidental, um dos termos mais proferidos nos últimos dias é fundamentalismo. Muita gente está dizendo esta palavra a torto e a direito, mas me questiono se  a profundidade deste conceito esteja na perspectiva da maioria que fala e repete sem parar. Bom tema para tratar com os meninos. Será que fundamentalismo é coisa só de muçulmano? Bush, ao invadir o Iraque dizendo que Deus estava do seu lado, não teria sido movido por um fundamentalismo cristão? E, aí, vêm outros temas que podem ter a ver com os estudos de nossos queridos alunos: Cruzadas, Inquisição . . . Outra coisa: o atual mundo "Ocidental" também não pode ter lá seus fundamentalismos? O querido mestre Milton Santos dizia que o consumismo é o fundamentalismo de nosso tempo. Bobagem? Será? Já vi muitos casos envolvendo angústias, tragédias ou desencantos nos quais, ao invés de rezar, as pessoas simplesmente vão às compras
Mas, antes que possa ser acusado de heresia pelos fiéis seguidores do "Ocidentalismo", gostaria de ratificar que sou absolutamente contrário a qualquer tipo de terrorismo - inclusive  o que vitimou a  Charlie Hedbo. Temos de combatê-lo, sim, e a todos os outros. Com 55 anos de idade, já vi e aprendi muito sobre isso.  Já tivemos até bombas atômicas sendo jogadas sobre cidades enquanto as pessoas dormiam . . .  Apenas quero poder ensinar mais do que a mídia já ensina - afinal, sou pago para isso. E, por falar em terror, tremo de medo de que aconteça, na Europa, o que já vimos em passados remotos - ou não tão remotos assim. Afinal, sinto no ar uma onda - meio cega, eu diria - de islamofobia. Tem partido de extrema direita esfregando as mãos, por aí. Bobagem minha? Bem, não custa falar. Ou será que custa?
Neste momento, coleciono matérias de jornais, revistas e vídeos para poder apresentar aos alunos. Muitos deles, certamente, os estudantes já conhecerão. Porém, talvez eu possa apresentar-lhes um outro olhar - mais um - sobre essa parafernália toda. Para que possam criar um posicionamento livre: só deles. Afinal, quem sabe não consigam ser eles próprios?

[1]  Fr.   Ser eles próprios

João Luiz Muzinatti   -   janeiro de 2015